Defensor Oficioso

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22 junho 2006

Crime ou falta de educação?


O Tribunal da Relação de Guimarães absolveu um jovem condutor que tinha sido condenado em primeira instância pelo crime de injúrias à autoridade. No acórdão, de 27 de Abril deste ano, o colectivo refere que «apesar de se ter provado que o arguido, com a mão direita fechada, apontou o dedo indicador à sua própria cabeça», enquanto falava com o agente da GNR, essa conduta «não tem relevo penal, não passando de uma expressão de falta de civismo, grosseria e mesmo falta de educação».

Isto apesar de o arguido ter consciência de que a conduta «era, objectiva e subjectivamente, lesiva da honra e dignidade pessoal e profissional do referido agente». O Tribunal de Caminha condenara, em Dezembro de 2005, um condutor pelo crime de injúria agravada numa pena de 50 dias de multa à taxa diária de 5 euros.


Durante o julgamento, o tribunal deu como provado que no dia 30 de Agosto de 2002, os militares da GNR autuaram o condutor que viajava sem cinto de segurança e sem documentos. Quando o agente pediu o certificado internacional de seguro, o condutor dirigiu-se ao veículo e, com a mão direita fechada, apontou o dedo indicador à sua própria cabeça, num gesto que os agentes interpretaram como querendo significar que seriam «malucos». Advertido para ter cuidado com o que dizia e fazia, o automobilista informou que iria processar os agentes. «Vocês não sabem com quem se meteram, porque eu sou filho do Capitão F. Vocês vão ver quem é que vai ser multado», acrescentou.

Um gesto com vários significados

Inconformado com a decisão, o arguido recorreu alegando que «a sentença é omissa em relação à zona da cabeça que foi tocada pelo indicador direito do arguido» e que «também é subjectiva e especulativa a interpretação dada ao aludido gesto», afastando qualquer intenção injuriosa, admitindo tratar-se apenas de uma «indelicadeza e inconveniência».

No acórdão que proferiu, a Relação criticou a decisão da primeira instância por não ter clarificado o sentido do gesto. «Se acompanharmos o parecer junto aos autos, uma dessas explicações estaria em que o arguido, com o seu gesto, quereria dizer que o guarda P ou ambos os agentes eram malucos; outros diriam que se quis significar simplesmente: tenham juízo! Mas quanto a isso a sentença é omissa, contentando-se com um discurso banal, de ordem subjectiva. É simplesmente opinativa».

Entendem os desembargadores que «no caso concreto, o significado literal do gesto de levar o indicador estendido à cabeça aparece dominado por um forte sentimento de ostentação» de quem até se coloca «em bicos de pés» para dizer que é filho de um capitão.

Não houve, segundo os juízes da Relação, «intenções ameaçadoras ou agressivas por parte do arguido». O gesto não é entendido como «um claro sinal de desprezo ou de desdém para com os agentes autuantes». Concluem, dizendo que a conduta «inscreve-se na linguagem do senso comum» pelo que «o arguido não pode deixar de ser absolvido».
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